Nos últimos anos, a sociedade tem se transformado graças às tecnologias digitais. Essa revolução também tem alcançado o setor público, que busca soluções digitais inovadoras que possam garantir uma contínua melhora nos serviços prestados aos cidadãos. Ocorre que muitas vezes, a administração pública não tem expertise, recursos ou enfrenta outras dificuldades para desenvolver as próprias tecnologias digitais. Assim, ao contratar empresas e soluções disponíveis no mercado, é possível que se obtenha serviços eficientes e customizados para as necessidades do setor público.
a contratação de inovações tecnológicas por gestores públicos ainda representa um relevante obstáculo para a transformação digital no setor público.
Os termos inovação e tecnologia têm sido aplicados ao tema de compras públicas de diferentes maneiras. Há pelo menos, três possíveis conceitos em uso:
Atualmente, as compras públicas, incluindo as contratações de inovação tecnológica, são reguladas pela Lei no 8.666/93, também conhecida como Lei de Licitações e Contratos para a Administração Pública.
A Lei 8.666/93 define o chamado processo licitatório para as compras públicas, que inclui o conjunto de procedimentos, princípios e critérios de escolha para a aquisição de produtos e serviços pelo setor público. Há também outras legislações posteriores que trazem elementos importantes para a regulamentação das compras públicas de inovação tecnológica.
Para que o setor público realize qualquer tipo de aquisição de bens, serviços ou obras, há dois possíveis caminhos: a abertura de um processo licitatório ou a realização de contratações diretas, que são permitidas nos casos em que há inexigibilidade ou dispensa de licitação.
Há 35 possíveis condições para que haja a dispensa de licitação. Uma delas pode se aplicar às compras de inovação tecnológica e está relacionada ao valor do bem e serviço: aquisições com valor igual ou menor a R$ 17.600,00 dispensam a abertura de processo licitatório.
A inexigibilidade de licitação, por sua vez, ocorre nos casos em que a competição entre fornecedores não é viável, por exemplo, quando há exclusividade do fornecedor (por exemplo, a compra de medicamento para doença tratada pelo SUS, que seja patenteado, não tenha substitutos e somente seja comercializado por uma empresa) ou a singularidade do bem ou serviço (como, estudos técnicos, pareceres, programas de treinamento, entre outros). Ambos os conceitos, a exclusividade e a singularidade, no entanto, devem ser muito bem fundamentados, na medida em que se relacionam à uma interpretação subjetiva.
Vencedora é a proposta com menor preço entre os licitantes qualificados.
Vencedora é a proposta com maior preço entre os licitantes qualificados. Utilizado para a alienação de bens e concessão de direito real de uso.
Vencedora é a proposta mais vantajosa com base em fatores de ordem técnica. Utilizado em serviços de natureza predominantemente intelectual.
Vencedora é a proposta com maior média ponderada entre notas de preço e técnica. Utilizado em serviços de natureza predominantemente intelectual.
Considerando também as modificações trazidas pela Lei 12.349/2010 e pelo Decreto 9.238/2018, foi instituída uma nova condição para a dispensa de licitação: a chamada Encomenda Tecnológica (ETEC).
A compra pública a partir da ETEC ocorre para a contratação direta de soluções tecnológicas inovadoras. Para isto são necessárias ao menos duas condições: (i) que a entidade pública ou privada contratada possua experiência na realização de atividades de Pesquisa Desenvolvimento e Inovação (PD&I) e (ii) que a solução para o problema técnico específico envolva risco tecnológico.
Por risco tecnológico, entende-se a possibilidade de insucesso no desenvolvimento de uma solução. Isso pode acontecer uma vez que se opta pelo desenvolvimento de uma solução inovadora para enfrentar um problema complexo: por vezes o conhecimento técnico-científico disponível é insuficiente ou a tecnologia desenvolvida não apresenta os resultados esperados. O risco tecnológico, portanto, reconhece a possibilidade de erro ou de resultados inferiores, algo que é comum durante um processo de inovação.
Embora a Lei de Inovação traga dispositivos que favoreçam a compra de inovações tecnológicas, especialmente considerando o conceito de risco tecnológico, a sua aplicação está muito aquém do desejado. Os dados sobre as compras públicas de tecnologia do governo federal para os anos de 2017 a 2019 demostram que a maioria das aquisições está concentrada na modalidade de pregão ou dispensa de licitação.
1. Considerando concorrência nacional e internacional.
2. Modalidades de contratação direta, através da não obrigatoriedade de licitação.
3. Dados até outubro de 2019. Fonte: Painel de Compras do Governo Federal
Foram identificados desafios relacionados a três temas: desenho da legislação, lacunas de conhecimento e riscos percebidos. Eles estão presentes entre os 4 principais atores envolvidos nos processos de compras públicas de inovação tecnológica no Brasil: gestores públicos, órgãos de controle, áreas responsáveis pelas compras públicas e empresas de inovação e tecnologia.
Muitos desafios são comuns a todos os envolvidos no processo de compras públicas, ao passo que outros são específicos para determinado ator. Em comum, os requisitos da legislação, as lacunas de conhecimento e os riscos percebidos tendem a dificultar a compra de soluções de inovação tecnológica, comprometendo o processo de transformação digital do governo federal, estados e municípios.
Um desafio compartilhado por todos os atores está relacionado ao não conhecimento pleno dos mecanismos mais recentes e dos casos concretos aplicados às aquisições de inovação tecnológica.
Com base nos aprendizados da legislação atual, as experiências nacionais e internacionais, há três possíveis caminhos para aprimorar o processo de Compras Públicas de Inovação Tecnológica (CPIT):